Mudanças climáticas: a solução está na natureza

novembro 23, 2017

As respostas para minimizar os impactos das mudanças climáticas podem vir da própria natureza?

A adaptação baseada em ecossistemas foi motivo de discussões importantes na Conferência do Clima de Bonn, na Alemanha, nas últimas duas semanas


Foi publicado no último domingo um artigo científico que identifica os municípios prioritários no Brasil para ações de adaptação às mudanças climáticas baseadas em ecossistemas (EbA), considerando a alta vulnerabilidade às mudanças climáticas (especialmente à seca), a elevada proporção de habitantes pobres e as florestas nativas ainda remanescentes nos municípios. Os pesquisadores, oriundos de ONGs e universidades, mostram que 22% dos brasileiros em situação de pobreza vivem em 398 municípios que guardam 1/3 dos remanescentes de vegetação nativa, o que mostra claramente a melhor maneira destes municípios se tornarem menos vulneráveis às mudanças climáticas é criar mecanismos de geração de renda e redução de pobreza a partir da natureza em pé. Uma combinação do fortalecimento de políticas de conservação com melhora das condições socioeconômicas aliadas a ações implantadas localmente, guiadas por planos de desenvolvimento local, onde EbA é um componente chave são essenciais para reduzir vulnerabilidade climática nesses municípios.

 

Desde o último relatório do IPCC, em 2014, foi dado grande destaque à chamada adaptação às mudanças climáticas baseada em ecossistemas. Isso nada mais é que o uso da biodiversidade e ecossistemas para reduzir a vulnerabilidade das pessoas às mudanças climáticas. Esse tipo de adaptação foi novamente muito discutido como uma estratégia de grande potencial durante a COP do Clima, em Bonn, durante as últimas duas semana. Praticamente em paralelo às negociações dessa COP, foi publicado artigo científico de pesquisadores de ONGs (Conservação Internacional, The Nature Conservancy, Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável) e da academia (Universidade de Miami e Universidade Federal do Roo de Janeiro), na revista "Mitigation and Adaptation Strategies to Global Change", que identifica, no Brasil, 398 municípios prioritários para ações de adaptação às mudanças climáticas baseadas em ecossistemas. Esses municípios apresentam em comum três características: 1) alta exposição à mudanças climáticas (especialmente à seca); 2) elevada proporção de habitantes pobres (com renda familiar inferior a R$140 por mês); e 3) com grande cobertura vegetal nativa remanescente. O artigo indica que a melhor maneira desses municípios se tornarem menos vulneráveis às mudanças climáticas é de criar mecanismos de geração de renda e redução de pobreza a partir da natureza em pé, e não às custas de sua eventual derrubada. Thaís Kasecker, da CI e doutoranda em Ecologia na UFRJ, diz que "as populações humanas pobres são as mais vulneráveis às mudanças climáticas; os locais que perderam grande proporção de sua cobertura vegetal e biodiversidade associada são os mais vulneráveis às mudanças climáticas. Assim, para as populações pobres desses municípios, a natureza em pé é um grande trunfo que possuem para sofrerem menos com as mudanças climáticas. Mas para que essa natureza permaneça em bom estado de conservação, será essencial que a partir dela possam surgir oportunidades de geração de renda para a população local".

 

De fato, o artigo mostra números espantosos: 22% dos pobres brasileiros vivem nesses 398 municípios, que por sua vez guardam mais de 1/3 dos remanescentes de vegetações nativas florestais e não-florestais do Brasil. Esses municípios se encontram nos biomas Amazônia, Caatinga e Cerrado, no norte-nordeste brasileiro, mas também na Mata Atlântica. Só o Pantanal e o Pampa não apresentam municípios com essas características. "O avanço das mudanças climáticas trouxe a sociedade à Era da Adaptação, ou seja, só reduzir a emissão de gases não bastará para conter ou reverter o quadro atual de aumento de temperatura – precisamos começar a nos adaptar a um planeta mais quente", disse José Maria Cardoso da Silva, professor brasileiro da Universidade de Miami. O professor destaca também que importantes políticas públicas que estão em curso no Brasil, como o Programa Bolsa Verde (que dá um complemento financeiro a famílias rurais que recebem o Bolsa Família, para que não desmatem) e o Sistema Nacional de Unidades de Conservação – ambos atualmente sofrendo várias ameaças por projetos de lei em trâmite no congresso – precisam não só ser mantidos mas também ampliados: "Hoje, apenas 26% dos municípios encontrados no nosso estudo possuem famílias que recebem o Bolsa Verde. Quanto às áreas protegidas, a Amazônia está mais bem servida em termos de área do que Cerrado, Caatinga e Mata Atlântica, mas em todos esses casos o nível de implementação é baixo".

 

Fabio Scarano, Prof. da UFRJ e Diretor Executivo da FBDS, vê na chamada "adaptação às mudanças climáticas baseada em ecossistemas" uma grande oportunidade para o Brasil: "O Brasil possui uma riqueza natural incomparável que, se bem preservada e manejada, pode garantir segurança alimentar, hídrica, climática e, simultaneamente, gerar emprego e renda. A adaptação às mudanças climáticas baseada em ecossistemas é um passo importante em direção ao desenvolvimento sustentável".

 

Para o artigo completo, acesse: http://rdcu.be/yOkf

 

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